sexta-feira, 23 de setembro de 2016

Relato de Parto (5/9) - VBAC Domiciliar – Valentina – 21.04.2016

Parte 5


Imersa em água quentinha, de olhos fechados e boca semiaberta percebi Renata apoiar minha cabeça em um travesseiro. Senti frio e ela depositou uma toalha sobre meus ombros. Apagou as luzes e pediu pela minha playlist de parto. Colocou as músicas que eu havia escolhido para aquele momento. Lembrei que tinha separado velas nos materiais do parto, mas não tive ímpeto de pedir. A gente realmente pensa coisas que deseja, mas não tem forças ou coragem para falar, como se cada gota de energia estivesse sendo armazenada para o final.

Ainda que as contrações fossem bastante doloridas, pareciam ter espaçado. No intervalo entre elas eu apagava ou me mantinha inerte. Não sei se dormimos, desmaiamos, entramos em coma ou morremos (rs), mas o corpo sábio nos dá uma trégua. Eu conseguia ouvir alguma conversa e por vezes respondia perguntas que faziam uns aos outros, num misto de consciência e inconsciência. “Ela não desliga”. Alguém na sala chegou a comentar algo sobre esse meu estado alerta de forma cômica.




Dentro da banheira tive meus momentos de maior introspecção. Perguntava-me porque tudo era tão avassalador. Realmente eu não teria fotos sorrindo. Por mais de uma vez senti e verbalizei que não conseguiria e queria realmente desistir. Ao mesmo tempo cobrava-me por pensar friamente em parar tudo, eu desejei tanto esse momento! Não conseguia me conectar com a Valentina e questionava: “qual o meu bloqueio?” Eu não tinha respostas. Eu nem mesmo sei se havia um bloqueio.

E na penumbra da sala, no aconchego do meu lar, eu tinha todos ao meu entorno. Doula à esquerda, na borda da piscina. EO à frente e marido à direita, sentando na poltrona ou na beira do sofá. Uma piscadela e as posições já tinham se invertido. De empós em tempos eles se revezavam como numa dança silenciosa, e frequentemente alguém me acariciava e segurava minha mão, que eu apertava com vontade a cada contração. Jogavam água sobre minha barriga em meio a palavras de incentivo: “pensa que é menos uma”, “ela está chegando”. Mas de tudo e todos, a maior surpresa foi, sem dúvidas, a sensibilidade do Douglas em repetir por diversas vezes: “Você está ótima, está indo muito bem”. Me sentia segura, protegida e acolhida. Não havia espaço e tempo para o medo.



Maju oscilava entre o colo do pai, sua mesinha de atividades ou a borda da piscina. Pedia para jogar água na minha barriga como os demais. Conversava comigo, perguntava sobre o tampão que saía aos poucos. Estava curiosa, mas também preparada. Assistimos a vídeos de parto, expliquei o que poderia acontecer nesse dia. Queria partilhar com ela esse momento, seria parte do meu legado, algo para compartilharmos enquanto mulheres, sobre o sagrado feminino, sobre a origem da vida.




Minha playlist rodava, mas eu só me fixava em algumas passagens eventualmente. Saí algumas vezes da água para tentar outras posições, à medida que a água esfriava e as contrações intensificam. Sem contar que fui para a piscina cedo demais em termos de dilatação, o que poderia “parar” o processo. Voltava para o chuveiro, sentava no vaso sanitário, ficava em pé apoiada no Douglas, mas acabava voltando para a piscina. Douglas trazia baldes de água quente. Não queria massagem, o toque na lombar me incomodava, mas solicitava que Lia e Renata apertassem meu quadril durante algumas contrações, o que era muito bom.

Eu não conseguia comer, embora a equipe sugerisse eu tentar algo. “Come um chocolate”. A náusea não permitia. Sentia sede e apenas molhava a boca. Deram-me uma bala que sambou na boca e logo repeli, frustrando a tentativa da equipe em me garantir uma dose de energia extra. Embora não conseguisse ingerir nada, era reconfortante saber que poderia se o quisesse. 


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